Ainda ecoavam os foguetes da eleição do «professor» em mais uma «festa da democracia» e já a ministra do Trabalho, Helena André, levava à Concertação Social a proposta do Governo para a alteração das regras das indemnizações por despedimento.
No final de um dia a concertar com os parceiros – os quais, excluindo a CGTP, bem se podiam chamar compinchas –, a ministra afirmou querer alinhar a nossa legislação com a da moderna Espanha, e justificou que, ainda assim, conservaremos um dos regimes mais generosos no contexto europeu.
A minha memória recuperou o «pelotão da frente» e o «oásis» que Cavaco Silva vendeu a cada passo da UE por Portugal adentro, mas sustive a náusea e mergulhei nos pormenores noticiosos. Rezam mais ou menos assim: o executivo pretende «um tecto máximo e o fim do limite mínimo a pagar», bem como a criação de «um fundo para financiar os despedimentos». Trocado por miúdos, «hoje o trabalhador tem direito a 30 dias por cada ano de casa (mais diuturnidades). Mas o executivo quer reduzir para 20 dias». Nos contratos a termo, «aplica-se a mesma regra».
«Haverá um limite máximo?», pergunta ainda o Económico. «Sim, o Governo propõe um tecto de 12 meses nas compensações». E «um limite mínimo? – continua. Actualmente, os trabalhadores despedidos têm direito, no mínimo, a três meses de salário-base e diuturnidades. Mas o Governo quer retirar essa opção».
Posto isto, fui ver quem já tinha contas feitas. No Negócios online, afirma-se que os contratados a prazo vão perder até 45 por cento das indemnizações, e o Público calcula que um trabalhador com quase duas décadas de casa tenha uma perda de 55,5 por cento.
Reacções? Não há pesquisa informativa sem elas, não é verdade? De Bruxelas ouve-se sonoros aplausos, diz a Agência Financeira, que informa também do regozijo do patrão do BES, Ricardo Salgado.
Já João Proença, agarrado ao persistente sorriso amarelo, gracejou que «se nos derem os salários espanhóis, aceitamos já». A piadola nem considerou que com ou sem salários espanhóis se mantêm os garrotes nas indemnizações.
Mas, mais grave, as palavras antecederam a garantia de que a UGT está, como sempre e invariavelmente usando esta expressão, «aberta a negociar», não aceitando «apenas» que «haja redução dos direitos dos trabalhadores no activo». Quanto às novas gerações, amanhem-se com os cortes nas compensações e dêem-se por contentes com o fundo que as garanta.
A Confederação do Comércio, por seu lado, não assumiu falar em nome de todo o patronato, mas percebendo-se que o fazia sublinhou dois aspectos: as regras devem abranger o universo dos trabalhadores e não apenas os novos contratados; caso o Governo insista no fundo participado pelas empresas, estas vão transferir a despesa para os salários. Simples!
Para Arménio Carlos, da CGTP-IN, este é um golpe nos «direitos mais elementares dos trabalhadores». O dirigente sindical advertiu que «uma proposta que favorece as entidades patronais» colocando «os trabalhadores a pagar o próprio despedimento», que «generaliza a precariedade» e «baixa os salários», não oferece margem negocial.
Eu acrescento que, à laia de fim da «festa» onde o capital sufragou a sua ditadura, as propostas do Governo de agravamento da exploração apontam aos bombos do costume: os trabalhadores.
Hugo Janeiro em "A talho de foice" Jornal Avante
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