Conferência de Imprensa, Jorge Pires, da Comissão Política do PCP
É com profunda preocupação que o PCP avalia a preparação do próximo ano lectivo e as consequências negativas que vão ter na qualidade do ensino, no prestígio da Escola Pública e no aumento do desemprego de docentes e outros trabalhadores da educação, que um conjunto de medidas que estão a ser implementadas pelo Ministério da Educação na organização e funcionamento do ano escolar 2010/2011.
A 31 de Julho salientámos, a propósito da entrevista da Ministra da Educação, a profunda contradição entre a retórica sobre o fim dos chumbos e uma prática que se caracteriza, nesta como noutras matérias, pela não consideração de que a maioria dos problemas do sucesso escolar e, também, da disciplina não se resolvem pela via administrativa, pois, tal, apenas leva à desqualificação do ensino e da Escola Pública.
Importante é que se criem bases para o sucesso, nomeadamente pelo reforço da intervenção pedagógica (inovação e adequação às necessidades reais), proporcionando uma maior e mais efectiva ligação das crianças às escolas, nomeadamente adequando currículos, revendo modelos de avaliação, mas igualmente reforçando o aspecto lúdico, designadamente no âmbito das indispensáveis respostas sociais a que a escola não deverá ficar alheia. Nessa altura não eram ainda conhecidas em toda a sua extensão um conjunto de orientações emanadas do Ministério da Educação que vêm confirmar a falta de transparência e seriedade política do actual governo na abordagem que faz dos problemas da Educação em Portugal.
É tempo de dizer basta a uma política que a coberto da tão propalada “grande reforma” na Educação com que o Primeiro-Ministro procura sistematicamente valorizar a acção do governo neste sector, mais não faz do que hipotecar a Escola Pública em Portugal.
É tempo de dizer basta a uma política que tem conduzido a Escola Pública, de acordo com a cartilha neoliberal, para o objectivo da perpetuação das assimetrias e injustiças, tornando-a num mecanismo reprodutor das relações e da ideologia dominante, confirmando desta forma uma estratégia de colocar o sistema educativo ao serviço dos interesses do mercado todo-poderoso e não numa perspectiva de formação integral do indivíduo, tal como consagra a Constituição da República Portuguesa.
A política deste governo também para a Educação, resume-se à ideia de “cortar e encerrar” e não contém em si qualquer estratégia consistente de desenvolvimento deste sector estratégico para o nosso país.
O encerramento de 701 escolas, onde se incluem estabelecimentos com mais de 21 alunos, ao contrário do que diz o Ministério da Educação elevando para cerca de 3 500 escolas encerradas desde 2006 e a criação de 86 mega-agrupamentos, são a face mais visível de uma ofensiva mais vasta que incorpora um conjunto de orientações das direcções regionais da educação para os agrupamentos e escolas das quais destacamos: a não aceitação da inscrição de crianças que fazem os seis anos de idade entre 1 de Setembro e 31 de Dezembro de 2010; o aumento do número de alunos por turma cujas normas legais impõem um máximo de 24 e 28 alunos, respectivamente no 1º ciclo do básico e 2º e 3º ciclos do básico e secundário respectivamente; turmas constituídas à margem das normas estabelecidas sobre a integração de alunos com necessidades educativas especiais, ou por terem mais de 20 alunos ou por integrarem mais de dois alunos com tais necessidades educativas especiais hipotecando ainda mais a capacidade da escola para ser inclusiva; escolas a quem estão a ser exigidas que refaçam as turmas já constituídas com a possibilidade de chegarem mesmo aos 32 alunos; a diminuição do número de professores bibliotecários; a eliminação dos créditos de horas das escolas que integram mega-agrupamentos, redução que vai sobretudo afectar de forma significativa o apoio aos alunos a que se junta um conjunto de medidas que visam a redução significativa do número de professores.
Desenganem-se os que pensam estarmos perante um conjunto de medidas dispersas. Elas são o resultado do aprofundamento de um projecto educativo que obedece cegamente à predominância da economia de mercado, numa lógica de mercantilizar e privatizar o máximo possível, objectivo que integra a construção de uma escola a duas velocidades: uma para os filhos dos ricos com o acesso a níveis superiores do conhecimento e outra para a esmagadora maioria das nossas crianças e jovens, cujas famílias têm parcos rendimentos e que agora vêem a situação agravar-se com os cortes na Acção Social Escolar, apenas vocacionada para responder aos interesses do mercado de trabalho. No essencial o mesmo que o PSD defende no seu projecto de revisão constitucional.
As movimentações da comunidade educativa que se estão a verificar por todo o país, contra o encerramento de escolas e a imposição dos mega-agrupamentos, mostram que o descontentamento e a vontade de intervir alargou-se substancialmente a outros sectores para além dos trabalhadores docentes e não docentes, desmentindo desta forma a tese propalada pelo governo de que os problemas se resumem a questões laborais.
Governo que mantém uma prática política assente na demagogia e na propaganda, que depois de uma fase inicial em que se diferenciou apenas na forma, voltou a erguer no Ministério da Educação um muro de arrogância e prepotência onde esbarram todos os que têm opiniões diferentes e procuram as melhores soluções para a Educação em Portugal.
Num quadro que se avizinha de continuação da conflitualidade e da instabilidade, com sérios prejuízos para o percurso escolar das nossas crianças e jovens, o novo ano lectivo parece estar inevitavelmente comprometido.
O PCP considera que a questão chave está hoje mais do que nunca, no resultado do confronto entre os que defendem uma Escola Pública de qualidade e gratuita e os que defendem a privatização do ensino. Para o PCP a Escola Pública de qualidade e gratuita é o modelo mais avançado e moderno, mais justo, mais livre e fraterno de organização do sistema educativo. É um factor necessário e imprescindível do desenvolvimento político, económico, social e cultural de Portugal e é um pilar da democracia e da nossa soberania.
Só uma Escola Pública que seja inclusiva e efectivamente para todos pode garantir realmente o sucesso, tanto escolar como, numa perspectiva mais ampla, educativo e social.
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